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DeFi: A infraestrutura financeira que a Europa e Portugal ainda não abraçaram

Gonçalo Freire, Diretor de Open Innovation da Swiss Fintech Association (SFTA)

24 Nov 2025 - 07:15

5 min leitura

Há mudanças tecnológicas que acontecem devagar e silenciosamente, e depois há aquelas que, de repente, se tornam inevitáveis.

O sistema financeiro global encontra-se precisamente num desses momentos de viragem.

Enquanto continuamos a depender de estruturas concebidas para a economia do século XX, está a emergir um novo tipo de sistema financeiro: digital, distribuído e programável, capaz de transformar de forma profunda a forma como o valor é criado, transferido e registado. O mais notável é que esta mudança não surgiu de uma vontade de progresso tecnológico, mas sim da necessidade de reconstruir a confiança num sistema onde os intermediários tradicionais têm demonstrado fragilidades significativas. Embora alguns países já tenham reconhecido a importância estratégica desta transição, a Europa e Portugal continuam expectantes, a observar em vez de agir.

Este novo modelo rompe com a forma tradicional de pensar os serviços financeiros.

Já não se trata apenas de digitalizar operações ou simplificar processos, mas de transformar o núcleo do sistema financeiro. Quando o dinheiro se torna programável, as transações deixam de ser pedidos manuais para passarem a ser respostas automáticas. Uma empresa deixa de esperar dias por uma confirmação de pagamento, um contrato liberta fundos assim que um determinado evento ocorre, uma exportação já não depende de múltiplos intermediários para garantir confiança entre as partes. Tudo isto reduz custos, elimina fricção e aproxima a estrutura financeira das condições reais da economia.

Quando os ativos deixam de existir apenas em papel e passam a estar representados digitalmente, a separação entre mercados locais e globais desvanece. Uma fatura emitida em Portugal pode ser financiada por investidores internacionais em minutos, uma obrigação municipal pode ser transacionada com total transparência, um programa público de incentivos pode ser monitorizado em tempo real, evitando falta de clareza e ineficiências. Este tipo de infraestrutura não reforça apenas a competitividade das grandes empresas, abre especialmente portas às PME, que são a espinha dorsal da nossa economia e que continuam a ser prejudicadas por burocracia, processos lentos e desigualdade no acesso à informação.

O problema é que, enquanto esta transformação avança de forma rápida e coordenada noutros países, Portugal permanece numa posição ambígua. Reconhece o potencial, mas hesita em agir. E esta hesitação tem custos reais. Nos últimos anos, vimos projetos portugueses de enorme qualidade serem desenvolvidos no estrangeiro devido à falta de um ambiente favorável em Portugal. Vimos talento qualificado procurar ecossistemas onde a inovação financeira é uma prioridade política e económica. E vimos empresas portuguesas, sobretudo as exportadoras, dependerem de infraestruturas e serviços criados noutros países, perdendo margem, independência e capacidade de crescimento.

Basta observar o que acontece em países como Singapura, Suíça ou os Emirados Árabes Unidos para entender o que está em jogo. Estas nações perceberam que a infraestrutura financeira digital não é uma tendência passageira, mas um ativo estratégico.

Criaram quadros regulatórios claros, atraíram talento internacional e tornaram-se centros globais para as empresas que estão a construir o futuro das finanças. Não se limitaram a assistir à mudança. Moldaram-na. E, como resultado, captam investimento, exportam tecnologia e definem os padrões que o resto do mundo acabará por seguir.

Em contraste, Portugal e a Europa continuam a encarar esta transformação como um conjunto de experiências marginais, em vez de a tratarem como uma questão económica central. É verdade que surgiram iniciativas relevantes, mas continuam dispersas, lentas e incapazes de escalar. Falta uma visão nacional que reconheça, de forma inequívoca, que a nova infraestrutura financeira pode aumentar significativamente a competitividade do país.

Precisamos de coragem estratégica para criar um ambiente onde as empresas portuguesas possam desenvolver, lançar e crescer produtos financeiros digitais com rapidez, mas com supervisão inteligente. E precisamos, acima de tudo, de reconhecer que esta nova arquitetura financeira representa uma oportunidade rara para um país de pequena dimensão ganhar vantagem num domínio onde o tamanho já não é o fator decisivo, mas sim a agilidade.

A próxima década será marcada por países que entendem que o valor já não está apenas nos serviços financeiros, mas nas redes que os suportam. E essas redes estão a ser construídas neste momento. Portugal tem talento, credibilidade internacional, empresas inovadoras e um ecossistema tecnológico que tem evoluído rapidamente. O que falta não é capacidade, é determinação.

O risco de permanecermos na margem é evidente. Pode passar por perder relevância, perder independência e tornarmo-nos dependentes de infraestruturas que não controlamos. Mas a oportunidade, se estivermos dispostos a aproveitá-la, é igualmente clara, posicionar o país como um dos hubs financeiros digitais da Europa, atrair investimento de qualidade, gerar exportações tecnológicas e permitir que as empresas portuguesas concorram globalmente em condições justas.

Mais uma vez, enfrentamos uma decisão estratégica. A história mostra que Portugal tende a reconhecer tarde as grandes mudanças económicas, mas esta transformação ainda se encontra numa fase em que podemos escolher o nosso papel.

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