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Inovação e Regulação: Entre a Inteligência Artificial (IA), a Confiança e a Complexidade Regulamentar
Por Dina Rato, ROC e senior adviser em Governance, Risk & Compliance
20 Out 2025 - 10:27
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O setor financeiro vive momentos desafiantes. A inteligência artificial (IA), a digitalização e a cibersegurança estão a redefinir os seus alicerces, mas a crescente densidade regulatória – DORA, AI Act, NIS2, RGPD, PSD3 – impõe um desafio estrutural: como inovar sem se perder no labirinto normativo. Este foi o eixo central do painel por mim moderado na conferência organizada pelo Jornal PT50, que reuniu Ricardo Oliveira Sousa, do Banco de Portugal (BdP), Duarte Gomes Pereira da ASFAC e Inês Caria do Banco Santander.
Deve a regulação basear-se em princípios ou normas? Foi um dos temas abordados. Se os princípios fossem claros as normas prescritivas seriam desnecessárias; por outro, com a margem interpretativa que os princípios conferem vem também associada incerteza jurídica e possíveis consequências financeiras, que no caso de inovação tecnológica, com investimentos significativos, podem ser muito pesadas. No setor financeiro, que combina legislação horizontal (como DORA, AI Act e RGPD) e vertical (a regulação bancária específica), é essencial o papel que o BdP pode, e deve, desempenhar na clarificação da malha regulatória para que as instituições financeiras saibam o que podem ou não fazer.
Esta regulação trava naturalmente a inovação tecnológica, na visão de Ricardo O. Sousa, do BdP, na medida do necessário, a favor de bens maiores para proteção de direitos essenciais, como seja privacidade, resiliência, segurança de dados. Inês Caria, alertou que o excesso de regulação no limite pode destruir valor, inclusive para os clientes, e defendeu conceitos simples e claros, com enfoque em objetivos passíveis de verificação, processos proporcionais, transparentes, rastreáveis e auditáveis, aplicáveis a todos os atores no setor financeiro, para que operem no mesmo “level playing field”.
Duarte G. Pereira, realçou que apesar do elevado custo regulatório que o setor suporta, este tem demonstrado uma grande apetência tecnológica, sendo em Portugal particularmente evoluído, e que, apesar da ambição de globalização do setor financeiro a nível europeu, muitos desafios ainda se colocam como seja a recuperação de crédito de clientes no estrangeiro e falta de comunicação de centrais de responsabilidades europeias. Defende, inclusive na Eurofinas e em outras instituições europeias, que a utilização de IA nos sistemas de avaliação (“scoring”) de crédito aumenta a eficácia da avaliação em termos de conteúdo, resultado e tempo, e não se justifica que seja classificada como de alto risco no âmbito do AI Act, com as restrições e exigências adicionais que daí resultam, podendo aplicar-se controlos por excepção posteriores, mediante solicitação de reavaliação humana pelo cliente bancário, sempre que necessário.
Na intersecção entre inovação e compliance, dois conceitos foram debatidos: smart compliance e suptech. Inês Caria, defende um smart compliance, em que a IA e inovação são aliadas, numa lógica ‘forward looking’ e que se torna um diferenciador e uma vantagem competitiva, inserido numa gestão de risco eficiente, antecipativa, com visão de helicóptero, proativa e não reativa ou responsiva a incidentes. Ricardo O. Sousa partilhou como o BdP implementou a plataforma de IA, ALYA, que, após as devidas análises de criticidade, riscos, conformidade e segurança, tem sido utilizada nomeadamente para sumarização, extração de informação, classificação, serviços ‘speech to text & image to text’ ou geração de conteúdo. Especificamente na supervisão comportamental, a ‘suptech’ ALYA tem sido usada na validação de minutas de contratos, classificação temática automática de pedidos de informação e reclamações (mais de 40 mil/ano) sobre os supervisionados do BdP, validação de regras nos suportes publicitários, estando para breve disponibilização de um assistente virtual no Portal do Cliente Bancário, que na sua visão muito contribuirá para o aumento da literacia.
A necessidade de literacia digital e financeira, a hiperpersonalização do marketing, (legítima e desejável para melhor servir o cliente) que não pode significar manipulação de dados e exploração de vulnerabilidades de clientes (p.e., os idosos, os menos literatos, os sobre-endividados) foram também abordados. Foi destacado o papel que o compliance pode desempenhar no desenho de uma IA responsável que previna esses riscos, e a difícil tarefa do BdP em definir a fronteira. A importância da formação e informação de todos os envolvidos (clientes, colaboradores, gestores, administração) para reforçar a literacia financeira e digital é consensual, sendo um instrumento especialmente importante para a defesa do cliente contra práticas ilícitas, numa lógica de formar, não para alarmar, mas para capacitar. As iniciativas em contexto escolar, têm sido fundamentais, embora outras iniciativas que alcancem públicos já em idade mais avançadas sejam ainda necessárias.
Os tempos são de facto desafiantes, com a rápida inovação tecnológica, emergem novos riscos tecnológicos, que como Inês Caria notou a Administração deve estar atenta e ter a literacia digital para entender, interpretar, questionar decisões críticas, assegurar que os controlos previstos não são só cumpridos mas também compreendidos. Ricardo O. Sousa, do BdP, acrescentou que no caso particular da cibersegurança e combate ao cibercrime o setor financeiro deve colaborar e trabalhar em conjunto, unir esforços, e que o BdP poderá desempenhar um papel fundamental como dinamizador.
Para mim, foi uma honra e um privilégio, moderar tão ilustre e interessante painel onde ficou patente que a inovação e regulação implicam uma complexa gestão de equilíbrios, que deve ser estável, mas não estanque, e disponível para ser revisitada, desafiada e melhorada com os contributos dos vários intervenientes.
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