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O ‘turnaround’ da banca portuguesa

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Os cinco principais bancos têm hoje uma situação em termos de liquidez, qualidade de ativos, eficiência e capital que se aproxima, iguala ou supera as principais referências à escala europeia.

19 Mar 2025 - 07:04

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Foto: Freepik

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“Nos últimos anos, níveis mais elevados de taxas de juro permitiram ao setor alcançar rendibilidades superiores para remuneração dos acionistas, reforço da sua resiliência e investimentos necessários para a sua viabilidade futura”, referia o relatório de Estabilidade Financeira de novembro de 2024. E acrescentava: “os desenvolvimentos positivos que se têm consolidado em anos recentes no sistema bancário português refletem o processo de desalavancagem do setor ao longo dos últimos quinze anos e, mais recentemente, fatores cíclicos favoráveis, como a subida rápida das taxas de juro em 2022 e 2023 e um crescimento da economia portuguesa acima do seu potencial”,

De facto, em 2024 os bancos continuaram a operar num quadro caraterizado por liquidez robusta, estabilidade da qualidade creditícia dos ativos e níveis crescentes de rendibilidade com reflexo positivo nos rácios de capital. Por exemplo, no final de 2024, o rácio ‘Liquidity Coverage Ratio’ (LCR) da Caixa Geral de Depósitos situou-se em 322,9%, valor superior ao requisito regulatório de cobertura de liquidez vigente (100%) e os capitais próprios atingiram os 10,6 mil milhões de euros através da geração orgânica de capital, crescendo 3,6 mil milhões de euros desde a recapitalização.

Fazendo uma retrospetiva, dos cinco grandes bancos, apenas o Santander não teve de recorrer a planos de reestruturação e a ajudas financeiras públicas. Em 2012, no BCP, o Estado subscreveu 3 mil milhões de euros de instrumentos híbridos convertíveis (designados CoCos), houve um aumento de capital de 500 milhões de euros. No BPI, o Estado subscreveu 1,5 mil milhões de euros de CoCos, e um reforço de capital de 200 milhões de euros para recomprar nessa mesma quantia ao Estado, ficando com 1,3 mil milhões de euros em obrigações convertíveis. O Estado foi ressarcido por estes apoios. Na CGD, o Estado subscreveu 900 milhões de euros em CoCos e, enquanto acionista único do banco público, fez um aumento de capital de 750 milhões de euros.

Nos anos seguintes, a voragem financeira levou, a 4 de agosto de 2014, à resolução do BES, dividido entre o denominado BES mau e o BES bom, que se transformou em Novo Banco, detido inicialmente pelo Fundo de Resolução – entidade pública financiada por contribuições dos bancos – capitalizando-o com 4,9 mil milhões de euros. Em outubro de 2017, 75% do Novo Banco foi vendido ao fundo de investimento norte-americano Lone Star. Este injetou mil milhões de euros no Novo Banco e acordou com o Estado um mecanismo de capital contingente até 2026, com um limite de 3,89 mil milhões de euros. Este Acordo de Capitalização Contingente (CCA) foi extinto em dezembro de 2024, resolvendo disputas e aumentando os rácios de capital em 47 pontos base.

Em 2017 foi acordado com a Comissão Europeia um Plano de Recapitalização da Caixa Geral de Depósitos que implicou um aumento de capital em dinheiro no valor de 2,5 mil milhões de euros. Com o pagamento de dividendos em 2024 ao Estado, conclui-se o reembolso integral do valor do aumento de capital.

Nota: os dados relativos ao BPI e CGD não estão disponíveis

A liquidez em 2024

Em 2024, a Caixa apresentou disponibilidade de liquidez, quer em depósitos junto do Eurosistema – cerca de 23 mil milhões de euros – quer em ativos disponíveis para colateral em operações junto do Banco Central Europeu – que no final de 2024 totalizavam cerca de 18,5 mil milhões de euros.

No Novo Banco, em 31 de dezembro de 2024, o rácio LCR situou-se em 164% e o rácio de financiamento estável líquido (NSFR) em 117%. O ‘buffer’ de liquidez do banco, e que a 31 de dezembro de 2024 ascendia a 16,9 mil milhões, mantinha-se composto maioritariamente por ativos de elevada liquidez e qualidade.

Ao longo de 2024, o BCP reforçou as posições de liquidez das três operações do Grupo (Portugal, Polónia e Moçambique), assente no significativo crescimento das respetivas carteiras de depósitos de clientes. Combinado com a estagnação ou crescimento incipiente das carteiras de crédito, resultou num reforço dos ‘buffers’ de liquidez descontáveis em bancos centrais em cada uma das operações, traduzindo-se numa melhoria de todos os indicadores de risco de liquidez, regulatórios e internos, quer ao nível consolidado, quer ao nível local.

Em consequência, no final do ano e em base consolidada, o rácio LCR atingiu, 342% em 31 de dezembro de 2024 versus 276% em 31 de dezembro de 2023, permitindo cumprir por larga margem o requisito mínimo regulamentar de 100%. O NSFR atingiu 181% em 31 de dezembro de 2024 versus 167% na mesma data do ano anterior, quase duplicando o mínimo regulatório de 100%.

O ‘buffer’ de liquidez disponível para desconto no BCE situou-se no final de 2024 em 33,7 mil milhões de euros, 5,9 mil milhões de euros acima do observado um ano antes, para o que contribuíram sobretudo a evolução favorável do ‘gap’ comercial na perspetiva da liquidez, o reforço dos portefólios de crédito elegíveis para desconto no BCE e o ‘cash flow’ gerado pela atividade. O ‘buffer’ de liquidez compreende, no final de 2024, uma posição longa de 2,8 mil milhões de euros sobre o BCE, superior à observada um ano antes.

O Santander em Portugal prosseguiu a sua estratégia de maximização da almofada de liquidez disponível para fazer face a eventos adversos. No quarto trimestre de 2024, a reserva de liquidez manteve-se em níveis confortáveis, terminando o ano com uma reserva de liquidez de 16,9 mil milhões de euros. A exposição ao Eurosistema situou-se nos -1,1 mil milhões de euros (posição excedentária).

Os fundos próprios de capital

Os fundos próprios totais dos principais cinco bancos cresceram baseados na rendibilidade registada, que permite sustentar a geração orgânica de capital, e no aumento dos ‘buffers voluntários de capital. Estes, se forem retidos, dotam as instituições de capacidade para acomodar choques futuros, nomeadamente em fases menos favoráveis dos ciclos económicos.

No final de 2024, os capitais próprios atribuíveis ao acionista da Caixa eram de 10,57 mil milhões de euros, ultrapassando a marca de 10 mil milhões de euros no decorrer de 2024 através da geração orgânica de capital. Como refere o relatório de resultados da CGD, “o valor total de dividendos distribuídos desde 2018 atingiu integralmente o valor do aumento de capital de 2,5 mil milhões de euros, em dinheiro, realizado em 2017. O capital gerado desde 2017, no montante de 6,12 mil milhões de euros, supera, assim, em 1,6 vezes o investimento público do Plano de Recapitalização, que já foi retornado ao acionista, mediante dividendos pagos entre 2019 e 2024 e os 3,61 mil milhões de euros retidos em reservas”.

No Novo Banco, a geração de capital ascendeu a cerca de +370pb, com o rácio CET 1 ‘fully loaded’ a aumentar para 20,8%, enquanto o rácio de solvabilidade subiu para 23,6%. Este desempenho evidencia a capacidade de geração de capital do modelo de negócio do Novo Banco e a disciplina na alocação do capital.

O papel dos ‘ratings’

“Beneficiando de quatro upgrades à sua notação de ‘rating’ durante 2024, o BCP executou duas transações em mercado, em ambas refinanciando antecipadamente emissões existentes por outras no mesmo instrumento, em condições de custo vantajosas”, refere-se no relatório do BCP, o que permitiu fazer duas emissões de dívida de 900 milhões de euros.

Depois da crise financeira de 2008, sobretudo com a crise das dívidas soberanas, em que tanto os ‘ratings’ da República como os dos bancos foram classificados como Lixo, Portugal teve de recorrer à Troika para um empréstimo de 78 mil milhões de euros.

Nesta altura, o ‘rating’ tornou-se decisivo na imagem dos bancos até pelos efeitos na sua atividade financeira. Por isso, a título de exemplo, a CGD passou para o ‘rating’ A, escalão superior ao ‘rating’ inicial BBB, no qual se encontrava desde 2011. A Moody’s eleva o ‘rating’ intrínseco a “a3”, regressando à categoria “A” pela primeira vez desde 2009, igualando o nível de Portugal e o mais elevado da banca nacional.

Por sua vez, no BCP, a revisão em alta do ‘rating’ por parte da Fitch Ratings refletiu a melhoria da capitalização e do perfil de ‘funding’ do Banco. A perspetiva positiva relativamente ao BCP (‘Outlook Positivo’) baseia-se na visão da Fitch Ratings sobre o modelo de negócio, a rendibilidade e a capacidade de geração orgânica de capital do banco, devendo estas dimensões evoluir favoravelmente com a execução bem-sucedida do plano estratégico e com a resolução dos riscos de ‘legacy’ relacionados com os créditos hipotecários denominados em moeda estrangeira na operação polaca.

Fundos anti-crise

Com a crise financeira de 2007 aumentou-se a regulação e os instrumentos de prevenção para assegurar que eventuais resoluções bancárias não ponham em causa continuidade das principais funções bancárias. Em complemento dos rácios de capital, foi criado um instrumento constituído pelo requisito mínimo de fundos próprios e de dívida elegível para bail-in (MREL – ‘Minimum Requirement on Own Funds and Eligible Liabilities’) a deter pelas instituições com importância sistémica como os cinco grandes bancos em Portugal. Destina-se a absorver perdas em momentos de crise, contribuindo assim para a estabilidade do sistema bancário, evitando resgates com recurso ao dinheiro dos contribuintes. As principais consequências para a gestão são a redução de ativos de maior risco e de ativos não produtivos, a emissão de dívida que possa ser convertida em capital e reforço de fundos próprios através de aumentos de capital ou retenção de lucros, por exemplo. Os requisitos de fundos próprios e de passivos elegíveis são atualizados pelo Banco de Portugal para cada um dos bancos.

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