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Trump regressa à Casa Branca: qual o impacto no setor bancário?
Alívio nos requisitos de capital e nos compromissos climáticos entre as “folgas” dadas pelo novo presidente dos EUA. A incerteza quanto às políticas de Trump no que toca à regulamentação já começou a contagiar a Europa.
20 Jan 2025 - 06:48
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Foto: Wikimedia/Gage Skidmore
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Foto: Wikimedia/Gage Skidmore
Donald Trump toma posse como presidente dos Estados Unidos nesta segunda-feira, 20 de janeiro, para o seu segundo mandato, marcando uma viragem em relação às políticas levadas a cabo pela anterior administração liderada pelo democrata Joe Biden.
Com base nas suas promessas de campanha e diretrizes reveladas até ao momento, espera-se uma aposta na desregulamentação, nos incentivos fiscais à atividade empresarial e uma postura mais agressiva, sobretudo em relação à concorrência internacional, para dar corpo ao seu jargão de sempre: “Let’s Make America Great Again”.
José António Pereira da Silva, managing director e head of Treasury do Bison Bank, vê em Trump um presidente reforçado neste segundo mandato relativamente ao anterior. “E isso é determinante para aquilo que é a perspetiva relativamente ao impacto que pode ter nos mercados de uma forma global. Aquilo a que temos vindo a assistir, desde que Trump foi eleito, é a um mercado muito volátil, porque se move muitas vezes ao sabor de tweets. E isso é sempre mau”, explica ao Jornal PT 50. Mas acrescenta: “Como é evidente, há agentes de mercado que estão muito satisfeitos com esta conjuntura, porque isto cria volatilidade e há agentes de mercado que vivem dessa volatilidade, nomeadamente intermediários e especuladores. Agora, para a economia real, a instabilidade e a falta de confiança nunca são boas”.
A imprensa internacional deu conta, na passada semana, de que Trump assinará 100 ordens executivas no primeiro dia de mandato, não se conhecendo ainda as medidas em questão. Paula Carvalho, economista-chefe do BPI, chama a atenção para este clima de incerteza que ainda paira sobre aquela que será a atuação de Trump. “São ainda incertas as medidas e ações concretas que a nova administração tomará. De uma forma genérica, a banca poderá beneficiar caso se concretizem a redução de impostos e medidas de desregulamentação, que tem sido associada, por exemplo, ao cumprimento dos objetivos climáticos”, sublinha.
Na realidade, a pressão sobre os bancos a nível ambiental começou a aliviar nas últimas semanas, com a saída dos seis maiores bancos da Net Zero Banking Alliance (NZBA), a iniciativa das Nações Unidas que visa alinhar os investimentos bancários com objetivos ‘net zero’. A saída foi encabeçada pelo Goldman Sachs, seguido pelos Wells Fargo, Citigroup, Bank of America, Morgan Stanley e JPMorgan. Este êxodo levantou dúvidas sobre o compromisso destas instituições para com o combate às alterações climáticas, agora sob a égide de Trump.
Menos regulamentação

José António Pereira da Silva, managing director e head of Treasury do Bison Bank
É conhecido que Donald Trump defende, de facto, a redução do peso da regulação para tornar as empresas, incluindo bancos, mais ágeis e competitivas. Tudo indica que estas mudanças serão bem-vindas pelos bancos americanos que já se manifestaram contra requisitos de capital mais elevados. Regras mais flexíveis também poderiam permitir a consolidação do sistema bancário dos Estados Unidos, onde existe um grande número de bancos médios. “A desregulamentação é uma tendência que está a acontecer a nível global”, destaca José António Pereira da Silva. “Naturalmente, Trump tem todo o interesse nisso porque faz parte da sua estratégia política, ainda para mais com os aliados que tem. E também tem bastantes interesses em que o mercado seja desregulamentado no sentido de poder ser mais dinamizado a todos os níveis”. Na sua perspetiva, esta medida “vem favorecer o mercado de capitais, de uma forma geral, pois sendo este estimulado naturalmente os bancos ou as instituições financeiras vão beneficiar disso”.
O responsável do Bison Bank também prevê que a desregulamentação possa liberalizar os trâmites ligados à concentração de bancos. Nomeadamente, negócios que poderão acontecer “e que estavam um bocadinho reféns dessa regulamentação”. Até porque “Trump tem a Câmara dos Deputados, tem o Senado e tem o Governo. E isso pode, de alguma forma, abrir espaço para que possa haver mais negócios; não sei se fusões ou aquisições”, acrescenta.
Promoção dos ativos digitais
O novo presidente também quer dar um novo alento à inovação, aos ativos digitais e às fintech. Durante a sua campanha, Trump destacou os méritos dos ativos criptográficos. Os executivos da indústria antecipam uma mudança na política e nas atitudes dos reguladores dos EUA, após uma administração democrata que foi vista como mais hostil relativa aos ativos alternativos.
“O próximo presidente tem mostrado também o seu apoio ao fomento das moedas digitais e dos criptoativos, por exemplo, através de uma menor regulação deste mercado e menores entraves ao seu uso mais generalizado, designadamente por entidades que habitualmente apenas utilizam a banca tradicional”, observa Paula Carvalho.
Trump indicou intenções de criar um ambiente regulatório mais favorável à inovação financeira, incentivando a integração de tecnologia no sistema bancário tradicional. Isso pode acelerar parcerias entre bancos e start-ups, mas também colocar problemas a instituições menos preparadas para competir num cenário de digitalização acelerada.
Impacto na Europa

Paula Carvalho, economista-chefe do BPI
Num mercado que funciona de forma global, ainda não é certo que tipo de impacto as medidas de Trump terão no espaço europeu. A economista-chefe do BPI considera que, na Europa, “o efeito será mais indireto, mas ainda muito incerto, via efeitos na atividade económica dos EUA e seus eventuais impactos na UEM, na inflação e nos fluxos comerciais – por via da imposição de tarifas – e das taxas de juro, podendo atrasar o processo de redução dos juros caso as pressões inflacionistas regressem”. Paula Carvalho considera também que “os impactos na confiança dos agentes, no equilíbrio geoestratégico global e na cotação do euro por exemplo, serão fundamentais para aferir os efeitos potenciais na banca europeia”.
A imposição de tarifas comerciais é vista, também por José António Pereira da Silva, como a maior preocupação que poderá advir desta nova administração. “Se se confirmarem todas essas medidas de Trump, relativamente ao comércio, a Europa vai ter problemas”, refere o managing director do Bison Bank, explicando que o crescimento da Alemanha poderá ser reduzido em cerca de 1,8% do PIB. “É brutal”, comenta. Portanto, “a Europa tem problemas que naturalmente vão ser agravados se se confirmar esta política protecionista”.
Relativamente ao setor bancário em si, José António Pereira da Silva chama a atenção para a eventual subida do crédito malparado (NPL, na sigla e inglês). “Isso vai ter impacto naturalmente nos rácios de capital do sistema financeiro”, sublinha. Na sua perspetiva, “podemos estar aqui numa situação em que a autoridade monetária, neste caso o Banco Central Europeu, que é dominante na zona Euro, possa ter que descer ainda mais taxas para evitar uma crise de liquidez, um impacto maior na dívida, seja a dívida soberana, seja a dívida da economia real, não só de particulares, mas também das empresas. Por outro lado, vai ter que lidar com uma conjuntura de inflação que ainda não está estabilizada”.
Na realidade, a incerteza quanto às políticas de Trump no que toca à regulamentação já começou, de certa forma, a contagiar a Europa. Ainda que não pertença à Zona Euro, o Banco da Inglaterra informou, na última sexta-feira, que vai adiar a implementação dos requisitos mais rigorosos de capital bancário por um ano, até janeiro de 2027, de forma a poder esperar pelas decisões dos EUA nesta matéria. “A Prudential Regulation Authority, em consulta com o HM Treasury, decidiu adiar a implementação do Basileia 3.1 no Reino Unido por um ano, até 1 de janeiro de 2027. Isto permite mais tempo para que surja uma maior clareza sobre os planos para a sua implementação nos Estados Unidos”, referiu o Banco de Inglaterra no comunicado divulgado. Recorde-se que o Acordo de Basileia visa fortalecer a regulação, supervisão e gestão de riscos no setor bancário global.
Da promessa à real execução
Com a tomada de posse de Donald Trump, os investidores têm de prestar atenção a que promessas de campanha se tornam prioridades políticas. Isto terá implicações para a economia, ações e obrigações. A Schroders Economics Team prevê um crescimento do PIB dos EUA de 2,5% para 2025, acelerando para 2,7% em 2026. Estas previsões baseiam-se em certas suposições em torno da agenda política de Trump. Porém, segundo esta empresa gestora de investimentos, “maiorias reduzidas no Congresso devem limitar as inclinações mais extremas de Trump, mas ainda assim ser suficientes para prolongar os seus cortes de impostos que estão a expirar e apoiar os seus esforços de desregulação”. “E embora esperemos que ele implemente políticas protecionistas, estamos céticos de que estas incluam uma tarifa básica universal. Da mesma forma, suspeitamos que os seus esforços para expulsar os imigrantes ilegais poderão não atingir a escala prometida de 20 milhões”, analisa a Schroders Economics Team.
No entanto, se Trump implementasse integralmente a sua agenda política declarada, as implicações para a economia dos EUA poderiam ser bastante diferentes. A equipa de economia da Schroders modelou um cenário mais agressivo que inclui tarifas de 60% sobre todos os produtos chineses, bem como tarifas sobre o resto do mundo, juntamente com limites rigorosos de imigração e deportações. Se este cenário se concretizar, o enfraquecimento do comércio, uma pausa nas decisões de investimento e um choque geral na confiança provavelmente levariam a maioria das economias de todo o mundo à recessão e levariam a cortes significativos nas taxas de juro, concluem os analistas.
A dificuldade para os investidores será avaliar a probabilidade de qualquer política vir a ser implementada.
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