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Um pequeno abanão é sempre bem-vindo

Editorial de Cristina Dias Neves

21 Jan 2025 - 15:18

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Quando estou a escrever este texto, está Donald Trump a tomar posse e logo de seguida espera-se a aprovação de vários decretos que visam acabar no imediato com todas as “anomalias” que têm vindo a distorcer o espírito americano.

Apesar de considerar que é praticamente impossível para uma pessoa moderada simpatizar com o discurso de Trump, parece-me importante separar esta narrativa política populista do que poderão ser as políticas desta nova era republicana no poder e do impacto que estas poderão ter na economia e no sistema bancário.

Assim proponho olharmos para alguns pontos específicos. O primeiro é a desregulação esperada do sistema financeiro. Se a primeira Administração Trump já tinha revertido parte da regulamentação Dodd-Frank criada por Obama na ressaca da última crise financeira, parece que esta tendência se vai reforçar.  Menos exigências de capital, menos supervisão, menos compromissos ESG, logo, mais liberdade para crescer, para inovar, para surgirem mais fusões, maiores bancos e mais competitivos. É isto que os banqueiros esperam. E uma enorme imprevisibilidade. Aconselho-vos a ler o artigo da Sónia Santos Dias sobre o tema.

Face a esta perspetiva, não é de estranhar que todos os banqueiros e outros grandes do sistema financeiro, que se encontram esta semana em Davos, apelem de forma unânime a menos regulação no sistema bancário europeu, bem como ao reforço da integração europeia como o único antidoto para contrariar a falta de competitividade do sistema financeiro europeu.

Mas será mesmo assim? Será que a vantagem competitiva dos bancos americanos é mesmo a regulação menos exigente? Arriscaria dizer que não. Prova disso é que a regulamentação que surgiu na sequência da crise económica do final da primeira década do século não impediu os bancos norte-americanos de crescer e serem rentáveis, pelo contrário, mantiveram-se mais competitivos e sobretudo muito mais valorizados que os europeus.

Há três aspetos determinantes para a competitividade dos Bancos Europeus neste enquadramento e não é a necessariamente um enfraquecimento da regulação. O primeiro é a importância de acelerar a integração europeia permitindo que sejam bem-vindas fusões entre bancos oriundos de diferentes estados-membros. Apesar de algumas tentativas de fusão no espaço europeu, parece que tem sido difícil ultrapassar as fronteiras nacionais como comprovado na contundente reação alemã à tentativa de compra de mais capital do Commerzbank por parte do italiano Unicredit. O sistema financeiro é entendido como uma componente nevrálgica do estado-nação. Apesar de inúmeros esforços, parece-me que estamos longe de conseguir ultrapassar este preconceito.

E por falar em preconceito, introduzo o segundo tema. A fiscalidade. Arriscaria, no entanto, dizer que o que se passa no setor bancário não é exclusivo do setor bancário. É transversal a muitas áreas chave da economia que, na Europa, têm ficado para trás.  O setor bancário é, no entanto, aquele que parece sinalizar todos os males do sistema capitalista. Na realidade, não se compreende porque é que os bancos têm de acarretar com uma tributação extraordinária dos seus lucros, se não são mais rentáveis do que outras grandes empresas. E porque é que, apesar de todos no setor estarem cientes desta situação anómala, na política ninguém ousa mudar. “Tributar a banca dá votos” como comentam os maledicentes. É verdade que a usura tem sido castigada desde a noite dos tempos. Mas fará sentido continuar, nos tempos que correm, a castigar uma atividade que é essencial ao desenvolvimento das nações, das empresas, das famílias? Queremos ser um mercado competitivo, queremos evoluir? Ou queremos estrangular quem ousa criar valor?

Por fim, mas não menos importante, no dia em o Fórum de Davos se inaugura, Phillipp Hildebrand, vice-presidente da gestora de ativos BlackRock e ex-presidente do Banco Central Suíço, apontou o dedo ao incipiente e espartilhado mercado de capitais europeu. Enquanto um aforrador médio norte-americano investe a parte mais significativa da sua poupança em empresas via mercado de capitais, na Europa continuam a recorrer aos bancos como único recurso possível. O que falta para dinamizar o mercado de capitais, promover a inovação nos serviços bancários, criar produtos e serviços diferenciadores que promovam uma verdadeira concorrência no mercado?  Todos sabemos que os bancos têm de fazer investimentos enormes em tecnologia e inovação se quiserem ser competitivos e navegar nos desafios colocados pela inteligência artificial e pela transição energética. Não será certamente a este ritmo que iremos ultrapassar os obstáculos que temos pela frente.

Dito isto, concluo que, apesar das reservas que o discurso de Donald Trump me inspira, um pequeno abanão bem diagnosticado só pode ser benéfico para nós, Europeus. É que, às vezes, mais vale um fim com susto do que um susto sem fim.

 

 

 

 

 

 

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